Cenário avançou nas últimas décadas, mas ainda faltam políticas públicas eficientes para promover a verdadeira inclusão dos autistas na sociedade
O
crescimento
expressivo
na
quantidade
de
indivíduos
diagnosticados com autismo no mundo,
que
hoje já
representa
cerca
de
2%
da
população
do
planeta,
traz
à
tona
uma
discussão
importante:
os casos
de
autismo
estão
aumentando
ou os
números atuais
são reflexo
de uma
evolução
no
diagnóstico
do
transtorno,
tanto
em
crianças
quanto em
adultos?
Pesquisas científicas demonstram que o autismo tem uma forte base genética, que pode chegar a mais de 90% de herdabilidade. Nos últimos 20 anos, houve grande evolução no diagnóstico devido aos avanços das técnicas de sequenciamento. Mas no Brasil, ainda há precariedade na adoção de políticas públicas que permitam o acompanhamento e o tratamento de todos os brasileiros nessas condições. O Censo escolar registrou um aumento de 280% no número de estudantes com TEA matriculados em escolas públicas e particulares do país, apenas no período entre 2017 e 2021. E a Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que o Brasil tenha entre 2 e 4 milhões de pessoas com TEA.
“É pre͏ciso i͏nvesti͏r em p͏olític͏as púb͏licas ͏de Est͏ado, q͏ue per͏maneça͏m mesm͏o com ͏as mud͏anças ͏de gov͏erno. ͏Desde ͏setemb͏ro pas͏sado, ͏a aten͏ção ao͏s auti͏stas c͏onsta ͏na Pol͏ítica ͏Nacion͏al de ͏Saúde ͏da Pes͏soas c͏om Def͏iciênc͏ia (PN͏SPD). ͏Mas ap͏esar d͏e avan͏ços na͏ legis͏lação,͏ é pre͏ciso q͏ue as ͏leis e͏ as in͏iciati͏vas go͏vernam͏entais͏ “saia͏m do p͏apel” ͏e atin͏jam, d͏e fato͏, uma ͏dimens͏ão rea͏l de p͏roteçã͏o e de͏ inclu͏são”, ͏afirma͏ o Def͏ensor ͏Públic͏o Fede͏ral An͏dré Na͏ves, e͏specia͏lista ͏em dir͏eitos ͏humano͏s e in͏clusão͏ socia͏l.
O número de diagnósticos aumentou vertiginosamente, mas ainda há muito a ser descoberto. Pesquisas sobre as causas e características do TEA são hoje um tema primordial da área de neurodesenvolvimento. De acordo com especialistas, o TEA envolve, na verdade, uma condição multifatorial, uma relação ainda desconhecida entre fatores genéticos e ambientais. O transtorno pode apresentar diferentes graus: desde o TEA de alto funcionamento, caracterizado por dificuldades de interação social, mas sem prejuízos cognitivos; até distúrbios mais severos, marcados não só por problemas de socialização, mas também por dificuldades de comunicação e comportamentos repetitivos.
Por falta de um diagnóstico preciso, muitas pessoas só descobriram recentemente, na fase adulta, que têm TEA. Antes disso, percorreram diversos médicos em busca de tratamento para suas dificuldades. Algumas vezes, o diagnóstico só ocorreu quando o paciente decidiu buscar ajuda porque pretendia casar ou ter filhos. Outras vezes, a descoberta veio por meio de um filho com TEA, quando o pai ou a mãe percebeu que tinha características e comportamentos parecidos, ainda que leves. Esse, inclusive, foi o caso da advogada Barbara Moura Teles, atuante na área de direitos dos Autistas, mãe de uma criança com TEA e ela mesma, autista.
“Eu só descobri que era autista após ter recebido o diagnóstico de autismo de meu filho. É importante destacar que o TEA é definido pela ciência como uma condição neurológica genética. Isso significa que boa parte ou quase todos os autistas herdaram isso em seus genes, da carga genética de seus pais. Diversos estudos apontam que a carga genética masculina é predominante, mas eu estou aqui para discordar disso. Eu, mãe do Antônio, fui recém-diagnosticada autista, aos 40 anos, nível 1 de suporte com altas habilidades. Então a carga genética do Antônio também é minha”, pontua Barbara.
Henrique Vitorino, autor do livro “Manual do Infinito – Relatos de um autista adulto”, é outro que teve o diagnóstico tardio de autismo. “Sou um homem cisgênero, branco, de 32 anos. Fui diagnosticado autista somente aos 29 anos. O diagnóstico pode vir tarde, no entanto, o autismo nos acompanha desde sempre. Eu, particularmente, tenho muita dificuldade com imprevisto, mudança. Então, mesmo antes do meu diagnóstico formal, eu já percebia e falava dessas dificuldades”.
A boa notícia é que atualmente e, cada vez mais, os casos de autismo estão sendo diagnosticados precocemente e com mais facilidade. Com o advento da internet, dos sites e redes sociais, o acesso à informação é bem maior e muitas pessoas que sempre se sentiram “deslocadas”, “sem ambiente”, “diferentes”, começaram a escutar e a ler sobre autismo e se identificaram. Hoje em dia, também, os profissionais têm um olhar mais aguçado para diagnosticar o TEA.
No Dia Mundial de Conscientização do Autismo, celebrado em 02 de abril, destacamos a importância do diagnóstico adequado, do acompanhamento especializado e da inclusão social das pessoas com TEA. O diagnóstico não é simples. Não existe um biomarcador que aponte que alguém tem ou não tem autismo. Assim, é fundamental que neurologistas, pediatras e psiquiatras estejam cada vez mais preparados e atualizados para dar o diagnóstico com maior precisão e o mais cedo possível, a fim de garantir melhor qualidade de vida à essa parcela da população.